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Ao longo dos sete meses que ficamos longe do espaço ekoa, vivenciamos um período desafiador. Mês a mês, fomos experimentando novas maneiras de lidar com o isolamento e formas de dar sentido a nossa tarefa de educar e cuidar.

Nosso trabalho sempre foi pautado no princípio de garantir uma relação pessoal/afetiva de qualidade e em experiências nas quais o contato físico respeitoso entre educadora e criança permeava as relações.

Mesmo estando longe fisicamente, nosso foco se manteve em ficarmos próximos de alguma maneira e, para isso criamos estratégias que favorecessem a continuidade do nosso trabalho com as crianças e à manutenção do vínculo já construindo com e entre elas. Por inúmeras vezes, ouvimos relatos de famílias dizendo que o espaço era uma extensão de suas casas e, naquele momento, tínhamos o desafio de continuar representando bem este papel e foi isso que buscamos fazer ao longo do período de isolamento.

Depois de longos sete meses distantes, tivemos a notícia mais aguardada por todos nós. Mesmo com restrições de horários e uma porcentagem reduzida no atendimento às crianças, a partir de 07 de outubro pudemos retornar ao convívio presencial. Isso nos trouxe alívio e gerou boas expectativas, mas também, receios e cautela, pois tínhamos consciência de que precisaríamos seguir rotas diferentes da que estávamos acostumadas.

Um grande desafio era conseguirmos manter a proximidade e o afeto, mantendo as distâncias necessárias trazidas pelos novos protocolos de saúde.

Até então, na relação estabelecida entre as educadoras, bebês e as crianças, como também, nas interações estabelecidas entre elas, havia a presença do toque como uma marca registrada.

Como, então, iriamos negar o colo a uma criança? Como retomar o convívio presencial, sem acolher os bebês da forma que sempre fizemos? Era vazio e frio demais pensar na falta que o abraço nos traria no momento do reencontro!

Sem falar nos contatos calorosos entre as crianças quando chegavam ao espaço; no aconchego do colo que aquecia e, ao mesmo tempo as fortalecia para as despedidas com os familiares. Como se dariam a leitura labial tão essencial à comunicação, as aproximações carregadas de toques, as trocas de olhares que quase sempre culminavam em contato físico, gargalhadas ou gritos eufóricos e tantas outras demonstrações lúdicas e afetivas que marcavam nosso dia a dia com elas e garantiam uma atmosfera acolhedora para que ficassem bem sob nossos cuidados?

A mão da educadora que representa uma fonte importante de experiências, que abre caminhos para o desconhecido, que as protege do que as amedronta, que acalma, acolhe, alimenta e também se abre para deixá-las ir em frente sozinhas, com autonomia, seguindo o curso natural de seus próprios interesses, não poderia mais estar presente?

Temos buscado ressignificar todos esses sentidos desde o primeiro dia em que as portas do espaço ekoa reabriram para receber as crianças. Uma retomada que tem trazido novos sentidos aos nossos propósitos de cuidar educando e educar cuidando.

Nesse tempo, temos reaprendido que nossos olhares podem cumprir um papel muito semelhante ao que nossas mãos exercem. Uma troca de olhar sincera, terna e delicada, que se conecta de verdade com a criança, constrói confiança e faz brotar sorrisos. Temos vistos olhos que esperam uma resposta e que estão sempre dispostos a receber algum sinal de encorajamento.

A acolhida dos bebês, por incrível que pareça e diferente do que imaginávamos que seria, tem nos surpreendido positivamente. A nova configuração dos ambientes amplos e arejados facilitam os deslocamentos e instigam a curiosidade dos pequenos. Além disso,  configuramos cuidadosamente os ambientes com brinquedos e objetos que podem ser usados de muitas maneiras. A prioridade na organização desses espaços é bastante criteriosa, estamos sempre atentas à garantia da segurança física e da higiene, como medidas preventivas.

Para descobrirem o mundo, os bebês usam a exploração e, para tornar esta uma ação segura, procuramos retirar ou higienizar imediatamente de cena os brinquedos, objetos e superfícies que são levados à boca, assim que o bebê se desinteressa pela brincadeira.

Ao invés de restringir as inclinações naturais das crianças, refinamos nosso olhar para a importância do brincar livre deixando que elas criem mundos possíveis, enredos, fabulem, ficcionem, construam, descontruam, pois acreditamos que podem fazer grandes descobertas se sentirem que estão num ambiente que as acolhe e na presença afetiva dos adultos que se dedicam a cuidar delas diariamente.

Tenho dito para as pessoas mais próximas que tenho guardado dentro de mim muito abraços e pelo visto, eles ainda ficarão restritos por um tempo, mas sigo sendo alimentada pela beleza que as crianças apresentam todos os dias quando chegam aqui no espaço ekoa.

Vê-las em movimento, brincando e explorando as elevações do terreno, desbravando nosso quintal que agora também é um pomar é extremamente encantador.

Acompanhar de perto suas descobertas, contar histórias, fazer bilhete para Penha, nossa cozinheira, para que ela prepare um bolo de aniversário, conversar com as famílias, compartilhar as novidades vivências nos momentos das despedidas e poder receber beijos e acenos à distância, tem um valor inestimável que somente presença física é capaz de suprir.
Que bom que podemos viver tudo isso de forma tão intensa e humana!
Bem-vindos os olhares, sorrisos ocultos pelas máscaras e abraços docemente guardados para o futuro!

Por Márcia Oliveira