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Por Ana Lucia Bresciane | Coordenadora Geral do espaço ekoa e do projeto ampliaekoa

A partir de que momento o celular pode ser inserido na vida de uma criança?

Quanto mais tarde o celular for inserido na vida das crianças, melhor.

O desenvolvimento acontece em função de múltiplas interações que estabelecemos com o mundo, pelas experiências reais. Estabelecemos relações afetivas com as pessoas ao nosso redor, exploramos os espaços e materiais presentes em nosso ambiente, experimentamos os tempos diferentes das atividades que fazemos no cotidiano. Com o nosso corpo percebemos o mundo de muitos jeitos diferentes, pelas cores, pelos cheiros, pelo tato, pelo gosto, pelo movimento… muitas experiências sensoriais que acabam nos tocando, nos emocionando. No mundo real somos tocados e desafiados o tempo todo, somos convocados a dar respostas criativas a todo o momento. “A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca.” (BONDÍA, 2002, p. 21). As crianças e adolescentes precisam dessas experiências múltiplas para se desenvolverem integralmente.

O papel da escola é ser um espaço de vida, de encontro com pessoas diferentes, com linguagens diferentes, é espaço de construção de conhecimento. É através desses

encontros que a gente promove o desenvolvimento, que a gente promove a formação de sujeitos que sentem, que pensam, participam com inteireza e se relacionam com o mundo. O celular rouba o tempo desses encontros e é por isso que no espaço ekoa não permitimos que ele entre na escola. As crianças não podem usar nem na sala de aula, nem em qualquer outro lugar ou momento do dia.

Apesar do celular ser um instrumento cultural, de acesso à informação, de apoio à pesquisa, de ser um meio de comunicação importantíssimo nos dias de hoje, sabemos dos riscos que ele oferece. É possível usar outros dispositivos para acessar a cultura e/ou tecnologias digitais, por isso, não há necessidade, muito menos vantagens, em se optar pelo celular no ambiente escolar.

O fundamental na escola é valorizar mais o convívio, as interações afetivas, cognitivas, motoras, lúdicas, sensíveis e políticas – a escola é um espaço privilegiado para essas trocas e acredito que isso deva ser preservado. A escola, a meu ver, precisa ser um espaço de resistência. De resistência e de vida.

De que forma as tecnologias digitais podem ser incluídas no cotidiano escolar?

Acreditamos que o uso orientado e acompanhado é a única via possível para educar as crianças e adolescentes para o uso consciente e responsável dos meios digitais. Inclusive é importantíssimo favorecer as aprendizagens necessárias para que os adolescentes saibam usar de forma consciente essas ferramentas e lidar com todos os desafios que o mundo digital coloca.

Por isso, aqui no espaço ekoa temos um currículo de Educação Digital e essa é uma área transversal, que dialoga com todas as demais áreas, e prevê ações progressivas com os estudantes. Nas situações planejadas, as tecnologias vêm sempre à serviço das necessidades de aprendizagem e os estudantes nunca acessam conteúdo digital sem monitoramento e sem apoio. Eles precisam de ajuda na gestão do tempo e na forma de utilizar as ferramentas, assim como precisam de mediação para os conteúdos que acessam. E, para realizar esse trabalho, damos preferência por utilizar outros dispositivos, não o celular.

Referência: BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação, nº19, 2002.